AZUIS, CONFLITOS,
SONHOS.
Pode-se,
do infinito e do além, atender o chamado ao Adhan, a sagrada prece dos devotos
islâmicos ao Senhor Poderoso da criação, da morte, da vida. O canto lúgubre e
sonoro dos Almuadens, acalentados nas solidões das altas almádenas, que os impuros
depreciam suas imagens ao nominá-las de minaretes, reforça a imensidão do poder
e da santidade de Alá. A hora é de fé, labuta e destino para a reverência e a
genuflexão lavarem a alma e cremarem os pecados. Enquanto os pássaros volteiam pelos
mesmos serpenteados do rio encantado destinado à purificação das virgens, nada
melhor do que se envolver abismado pelas ruelas e becos, a cada passo dado, ao desviar
dos tapetes cobertos de oferendas, ao léu, no mercado de Ranjihad, na Estípia
Superior do Grantihá. Alá seja maior e proteja sempre os justos nestes destinos
de amor faltante e angústias imprevistas, enquanto não os conclama ao juízo eterno.
Exatamente com os indispensáveis cuidados tomados para os pisares cautelosos
não molestarem as oferendas fartas expostas, circulam os transeuntes carentes à
cata das escolhas das melhores fantasias e das mais delicadas imaginações.
Cirandam
despreocupados sem maiores atenções os curiosos, até se encantarem, estarrecidos,
à frente da tenda de Lehann Bandiche ao verem, descambando, esparramados da
porta até o mais íntimo interior, aconchegantes, mas desordenados, os melhores delírios
e os sonhos mais sutis por ele roubados das deusas imagéticas. Meticuloso e tão
logo as chuvas miúdas e alegres de verão terminem de brincar de enxaguar o
infinito, Lehann se atiça competente para o sequestro dos sonhos novos e
delírios saborosos, que as deusas, cautelosas, tecem no âmago das suas
intimidades, com carinho, para alimentarem os menestréis e os poetas. Reclamam as
Deusas-das-Cores entrelaçadas ao pé do arco-íris, serem sempre os melhores e
mais caprichados sonhos e delírios, que o sagaz mercador, Lehann, lhes surrupia
nas caladas das madrugadas, sem as recíprocas compensações de fantasias e,
pior, sem remorso algum. Fantasias são as matérias primas, edulcoradas,
revestidas de delírios para refazerem eternamente os devaneios imberbes.
Os
sonhos e os delírios roubados por Lehann são disputados por seguidores abnegados
e viajantes indômitos, após atravessarem desertos de insanidades e mares
bravios de loucura. As virgens chegadas escolhem seus sonhos na tenda de Lehann
para despirem seus véus diante dos príncipes idealizados em sonhos. Os moços
descem de seus corcéis fantasiados para, ao luar, imaginarem ousadas bacanais
com beldades acaloradas, nuas. Os idosos ouvem em silêncio e dos confins, os ritmos
dos próprios desejos inconscientes, ao sincopado dos Almuadens, aguardando as
promessas de garantirem lugares destacados, entre brumas doces, eternas e
suaves, ao fantasiarem seus sonhos de além ao lado de Alá, todo poderoso.
Madrugada:
tão logo o silêncio se apodera das almas e todos adormecem, deusas e Lehann conchavam
no recôndito das iluminuras, ao pé do arco-íris. As deusas se refazem, sorridentes,
rastreando as virgens, os mancebos, os idosos e em surdina escambam os sonhos
roubados, então sob os travesseiros, pelos pesadelos mais calhordas. Os almuadens
lançam sobre as deusas e Lehann as benções calmas de Alá.
Ceflorence 22/11/16 email
cflorence,amabasil@uol.om.br
Sr Florence,
ResponderExcluirObrigada por conduzir seus leitores a um passeio pelo cenário onde se juntam o canto - quase lamento - dos Almuadens, os becos e ruelas, os tapetes cobertos de oferendas até a porta da tenda de Lehann Bandiche, onde cada um tem a chance de "roubar" dele o sonho que melhor lhe couber. Mais uma vez, adorei sua crônica. Um cordial abraço.
Sra. Márcia, como sempre é uma alegria a gentileza da senhora, retornar com comentários carinhosos e afetivos. Muito obrigado.
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