OITÕES DAS DESFORRAS E RETIRANTES
Atiçara
sina amanhecendo de briga desaforada, Cadinho Prouco, pois palpitava carência,
como do pai trouxera, a muito, dos rincões das saudades. E carregou consigo dos
cerrados secos, vila arruada de poeiras rezingadas e encardidas, Oitão dos
Brocados, de onde a desfortuna o arrancara sem remorso. Urinou Cadinho largado
no sopé da torre da catedral tal qual se deu e o fez bem, como gostava, sobre
os seus tisnados encarvoados de silêncios e tristuras. Cinzelara certo ali, noite
anterior, emprenhado muito de amor e respeito às cativas preces, magias suas
ajustadas aos aléns nos recados postos, como a mãe sumida lhe ensinara para
nunca deixar de reverenciar orixá e deuses, atendendo cismas de cumprir promessa
de sucateiro apenado às des-abençoadas mágoas tantas. Prontidão do rumo do
catador fora desembocar raiando sol pelas incertezas de dia todo rasgado em
tarefas incalculadas no garimpo das agruras por restados, mitigação de
descartados, desaforos, devaneios, rejeitos dos vazios, desprezados, refugados
e das sobras inúteis dos outros gentios sobre-sofrer ele na merda. O delírio
arrotava azedo na cabeça perdida do catador. Assim se dava o troado encrustado
da faina, labuta arrolada nas desditas e tramas de Cadinho se desentendendo
consigo desde o sol intentar poente. Desatrelando dos manejos e desmandos, ora
sendo, afinadas as contas da trabalheira, pouca monta sobrara, nadinha a bem
prover, a noite chamou recanto de volta, depois de arrastar por uma jornada
bruta inteira e cada despautério o carro, foi atinando achar seus refúgios e o
carreteiro de sobrados juntou os catados pegos e volveu. Os ventos embalaram as
sanhas e os pássaros enrolados carentes nas solidões se acercaram dos aninhos e
pelo sim, depois das desforras, Cadinho afinou em propositados de assumir
abrigo também. Corpo moído apontou demanda, alma prudente atendeu premente.
Inteirado
no vir das providências, o arrastador no tirante da carroça deu conta de seguir
bem pelo meio do atiço do burburinho unhado do tráfego, carcomido, onde urdia
demência, recalcava agrura, para então o torvelinho debulhar confusões como
brotoejas nos rastejados dos carregos das caixas de papelões, latas, lamentos,
velhos ferros, desforras, sobras várias, vazias garrafas, desaforos, pesando tudo
uma servidão de penúrias. Angústia sobrava! Nas cismas o mundo reciclava
matéria, espírito, deuses cuidassem. Arquejados, arrastados, pneus encruando,
encastoados no ódio e nas pedras, no desassombro do destempero, fôlego
encolhendo as vistas de carência de atiçar achego ao despontado final, puxado
peso encarnado sobre os paralelepípedos cravando, amargos, Cadinho Prouco,
gemido goela vasta, atazanava as rodas vadias, debochadas, para os ajutórios
implorados às morosas no levante proposto da carga infame de pesada até restado
aprumar. Restado fim, meta Praça da Catedral da Sé, dali então acenando já às
cruzes dos campanários da igreja deslumbrando eternos. Cadinho alavancado, no
limite tendo, desespero, tormenta, corpo inclinado teso nas pontas dos pés descalços
enroscados à agonia, clamando aos bofes prontos para saltarem dos pulmões
chiando, caminhava pouco, movia por vez um dedo de nada, se tanto fosse a
dizer. O tempo se desfazia em amarguras sórdidas e nos derradeiros a boca
arfava descompensando canalha.
Ceflorence 24/08/17 email
cflorence.amabrasil@uol.com.br
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