quarta-feira, 24 de maio de 2017

POR SER EM POESIA - SÁBADO

Escapou de Levício em manobras sutis e delicadas, aportou no Condado de Transbéria, região ao leste das fantasias, mas de difícil acesso ao norte da sensualidade, trazido pelas ninfas de Cambélia, em seguida, tão logo os ventos permitiram, esparramou-se entre as mulheres de mais de seis desejos, embora ainda arrefecidas em relutâncias, e homens obstinados em continências e repressões afetivas, enclausurados, e junto veio a noticia que no Convento de Abiganhã Sefazil, por desatino e inconsequência das deusas do prazer, se introduzira de forma irreverente e dissimulada, em seus caprichosos e protegidos jardins, cuidadosamente semeados em canteiros reprimidos dos inconscientes, fertilizados com estigmas  recolhidas dos pináculos dos censurados, substância incontrolável, melíflua, atrativa.
Detalhes precisos da apavorante substância, classificada pelos monges, ainda pelos anabatistas, só os castos, e confirmadas por competentes videntes em estados de alucinação e pavor, definiam que em circunstâncias especificas se espargida de forma gutural, afetiva, perigosíssima ao pé da orelha, acima do pescoço, fatal, ou lançada contra a corrente dos preconceitos, a matéria delicada, sinistra e excitante, originária dos canteiros de Abiganhã, se apresentaria suavemente afrodisíaca, insinuante, des-preconceituosa. As recomendações de se eliminar todos os vestígios da maligna praga psicológica, como se articularam os movimentos defensores das intransigências e das condenações, eram que dependendo da quantidade, da coloração, da oportunidade no consumo desavisado, sem repressão, a predestinada petulante alienígena se imiscuiria em momentos de silêncios e resguardos, trocando mensagens espirituais, desvirtuando valores e provocando criminosos encantamentos contraditórios, embalados sorrateiramente e substituindo os recatos pelos festins pagãos, orgias, ou outros concílios não recomendáveis aos gentios de boas condutas.
Mas era sábado dos deuses insubordinados. Os caminhos foram se amoldando as restrições e as mulheres de seis desejos e os homens dos claustros castos vestiram suas saudáveis demências de finais de semanas, resguardaram suas angústias nas prateleiras livres das crianças, tomaram seus vinhos antes das aves contornarem os arrecifes onde estavam instaladas as solidões de suas mesas individuais e se procuraram receosos de que as pragas de Abiganhã os obrigassem a se despir dos medos e das nostalgias. O refrão das ninfas foi se acomodando, desmilinguido, costas eretas se desfazendo em olhados, desdizendo em murmurinhos, confidências. As ninfas defloraram sobrados azuis de fugidias meiguices dos jardins de Abiganã entre as mesas. Salpicaram quatorze desejos, sem preconceitos, distribuíram uns cata-ventos despidos de receios e deixaram as sementes das pragas dos conscientes adornando as fantasias das mulheres de seis desejos e dos homens enclausurados.
Dos jardins de Abiganhã as deusas dos prazeres se acomodaram nas suas petulâncias, desmediram irresponsabilidades risonhas e devoraram um imenso raio de solidão que amaldiçoava o Condado de Transbéria. Bebericavam seduções, por serem deusas. Intimaram que por ser sábado as ameaças se realizariam, por ser sábado.          
Ceflorence  15/05/17    email cflrence.amabrasil@uol.com.br

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