DEUS ACUDA.
Verão
assumido de aguadas boas no Grotão do Rio Pardinho prometendo fartura. Deram-se
as rezas, velas de sebo juntadas e acesas preventivas dos desatinos das águas e
das enchentes não estorvarem os roçados gordos. Os filhos de Nhonhô do Grotão, traquejados
nos sovados das labutas, atiçavam as juntas de bois nas confianças de muito feijão,
milho, arroz maturando no varjão no lugar das macegas. Terminado o grosso das tarefas,
os moços do Nhonhô, nos troçados e risonhos, ajustaram corretos trejeitos de ir
machadando no capricho e arte os arremedos de um tronco de pau já meio imbuído
de espantalho para passarada. Cismando até de humano porte, o pau foi assumindo
ar zombeteiro de troças tanto como de espantalho para as sortidas roças.
A
artimanha do Neco e do Juca do Nhonhô desvirou meio como gente, ate batizada de
Ditonho pela meninada ciscando nas brincadeiras ao redor. Alternavam as roupas coloridas
e alegres, punham-no ora pândego, carregando jacás às costas, ora com os
baixeiros dos cavalos esvoaçando nos ventos ou com chapéu velho desabado.
Barrigudo ou corcunda das palhas enfiadas na camisa ou na calça ficava caprichoso
de arrogante. Mas o tempo veio feio aquela quinta-feira madrugando em meados de
janeiro. A enchente debochou das margens de rio, vasou nas estradas, apavorou
gente. Carregou afogada criação de todo porte e pendurou nas quiçaças. A
meninada cedo correu sobre os desastres, salpicou as lamas e chorou a carência
do Ditonho sumido nas aguadas.
Dois
anos esqueceram as sinas para traçar cismas novas. Coube ao Juca ouvir na venda
do Capiló conversa de milagres em Sobradinho das Tapiras, sete léguas rio
descendo. Crescia na vila fama das bênçãos certas de um padre, por Orêncio
nomeado, graças às forças de imagem antiga, Santo Atílio, que fora salva por
pescadores no Rio Pardinho. Davam-se ali assistidas curas, de doença brava, de
cego ou de aleijado quando as desgraças eram bentas pelo padre aos pés do santo
milagroso. Nhonhô e os filhos, nos propósitos, se aprumaram nas montarias boas
para partilharem em Sobradinho do santo, da festa, da vida, da fé.
Apeados,
chapéus nas mãos, chegados; fila preguiçosa, longa calada, pia, romeiros. Foram
se arribando sisudos Nhonhô e os meninos ao altar; sala miúda, capela simples,
silêncio. Neco, ouriçado, o primeiro a defrontar o santo, gritou – “Pai, pai é
o Ditonho pai, deus acuda pai”!
`Prezado Sr Florence... Faz tempo que não comento suas belas crônicas, embora não tenha deixado de ler uma sequer... o tumulto do dia a dia é o culpado pela minha falta rs rs ... mas depois de ler essa última não poderia deixar de deixar aqui o meu comentário: Sensacional a estória do Ditonho!.... Um cordial abraço
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