quinta-feira, 7 de julho de 2016

PREMONITÓRIOS MORREDIÇOS
Ao adentrar pela sacristia, não penetrar, pelas insinuações sensuais adversas, visto o conflito que o termo poderia envolver involuntariamente e afastar convertíveis, sem qualquer imponência, pretensão ou galhardia, Élpio Ciratra não poderia, àquela altura, garantir que seria tranquilo o processo de restabelecimento dos seus aguardados. Estimava, ainda sóbrio, saborear Élpio, ou talvez perder-se, pelos trilhos dos aléns, com ou sem certeza de palmilhar andejo e imediato para o eterno da vida que lhe insinuavam. Por ser dia de restabelecimento das incongruências pastorais, prestes às beatificações, os fenômenos das paixões, ainda pagãos antes dos sacramentos e dos óleos, ficavam disponíveis do lado oposto ao da censura e as absolvições, que estavam com frio, se colocaram junto aos altos vitrais góticos, devotando esplendor ao eterno, que o sol beijava com parcimônia e afeto. Estes seriam os apetrechos, paixões e absolvições, com que Élpio poderia contar para empreender sua aventura de desencarnar para sempre ou pela primeira vez, como só poderia saber depois. Élpio libava com ternura saber que o importante não é ter certeza, mas sim montar o disparate fogoso ao passar arreado.  
Confirmou que a existência se fazia destas minúcias essenciais para adoçarem o acaso, Élpio. Ainda estava aprendendo a morrer com a imaginação forrada de fantasias, para reviver, segundo diziam, em estase eterna e inacabada. Os assuntos dos infinitos sejam eles pelas rotas das reencarnações sucessivas, dos castigos afogueados dos infernos, das revisões dos pecados purgados, das indefinições límbicas sem batismos, das saturações das contemplações eternas aos criadores ou detonadores, são muito saborosos e fáceis no atacado, mas no varejo, e com desconto, são conflituosos e paradoxais. Com a clareza de quem se desencarnaria corretamente avisado com antecedência requerida para os preparos, Élpio, coçando a virilha e imaginando como continuar de prontidão mística, não titubeou em ouvir um réquiem, atravessando as abóbodas da matriz e abriu a botelha de cristal com vinho.
Retornava ao mesmo processo, Élpio, por ser dia de neblina baixa e conseguiu deixar, antes de assuar o nariz escondido na manga do paletó, para que o monsenhor não lhe chamasse a atenção como sempre, um pedaço do terceiro quarto superior da própria alma, a mais antiga e saborosa, narcisista e edipiana, sobre o consolo barroco, grande, seiscentista, aonde se escondiam o cálice dourado, os pecados veniais, o vinho, as vestes vistosas e as bolachas não consagradas. A vantagem da alma Elpiana era sua divisibilidade em nacos convenientes para entrecortes descarnáveis: pecado, vingança, perdão, amor, arrependimento, luxúria, prazer, ódio e seguem.
O monsenhor encontrou Élpio sonhando na sacristia com cavalos e trombetas rejuntando suas fantasias e pedaços soltos das almas, para continuar embriagando-se com o vinho que já tomara, sem ódio, com amor, na luxúria e prazer, sem perdão ou vingança, arrependimento, nda, e livre de pecado. Por ingênuo, Deus abençoou-o.

Ceflorence      25/06/16       email   cflorenceamabrasil@uol.com.br

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