PREMONITÓRIOS
MORREDIÇOS
Ao
adentrar pela sacristia, não penetrar, pelas insinuações sensuais adversas,
visto o conflito que o termo poderia envolver involuntariamente e afastar convertíveis,
sem qualquer imponência, pretensão ou galhardia, Élpio Ciratra não poderia,
àquela altura, garantir que seria tranquilo o processo de restabelecimento dos seus
aguardados. Estimava, ainda sóbrio, saborear Élpio, ou talvez perder-se, pelos trilhos
dos aléns, com ou sem certeza de palmilhar andejo e imediato para o eterno da
vida que lhe insinuavam. Por ser dia de restabelecimento das incongruências pastorais,
prestes às beatificações, os fenômenos das paixões, ainda pagãos antes dos
sacramentos e dos óleos, ficavam disponíveis do lado oposto ao da censura e as
absolvições, que estavam com frio, se colocaram junto aos altos vitrais góticos,
devotando esplendor ao eterno, que o sol beijava com parcimônia e afeto. Estes
seriam os apetrechos, paixões e absolvições, com que Élpio poderia contar para
empreender sua aventura de desencarnar para sempre ou pela primeira vez, como
só poderia saber depois. Élpio libava com ternura saber que o importante não é
ter certeza, mas sim montar o disparate fogoso ao passar arreado.
Confirmou
que a existência se fazia destas minúcias essenciais para adoçarem o acaso,
Élpio. Ainda estava aprendendo a morrer com a imaginação forrada de fantasias,
para reviver, segundo diziam, em estase eterna e inacabada. Os assuntos dos
infinitos sejam eles pelas rotas das reencarnações sucessivas, dos castigos
afogueados dos infernos, das revisões dos pecados purgados, das indefinições
límbicas sem batismos, das saturações das contemplações eternas aos criadores
ou detonadores, são muito saborosos e fáceis no atacado, mas no varejo, e com
desconto, são conflituosos e paradoxais. Com a clareza de quem se desencarnaria
corretamente avisado com antecedência requerida para os preparos, Élpio,
coçando a virilha e imaginando como continuar de prontidão mística, não
titubeou em ouvir um réquiem, atravessando as abóbodas da matriz e abriu a
botelha de cristal com vinho.
Retornava
ao mesmo processo, Élpio, por ser dia de neblina baixa e conseguiu deixar,
antes de assuar o nariz escondido na manga do paletó, para que o monsenhor não
lhe chamasse a atenção como sempre, um pedaço do terceiro quarto superior da própria
alma, a mais antiga e saborosa, narcisista e edipiana, sobre o consolo barroco,
grande, seiscentista, aonde se escondiam o cálice dourado, os pecados veniais,
o vinho, as vestes vistosas e as bolachas não consagradas. A vantagem da alma
Elpiana era sua divisibilidade em nacos convenientes para entrecortes
descarnáveis: pecado, vingança, perdão, amor, arrependimento, luxúria, prazer,
ódio e seguem.
O
monsenhor encontrou Élpio sonhando na sacristia com cavalos e trombetas rejuntando
suas fantasias e pedaços soltos das almas, para continuar embriagando-se com o
vinho que já tomara, sem ódio, com amor, na luxúria e prazer, sem perdão ou vingança,
arrependimento, nda, e livre de pecado. Por ingênuo, Deus abençoou-o.
Ceflorence 25/06/16 email
cflorenceamabrasil@uol.com.br
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