DESVAINEICENDO EM GRENÁS
Poderia ser, talvez fosse, nada é absoluto
agora quando a maré retornou desencantada da lua e os deuses amainaram, tanto
que me atrevi quase a garantir que atravessávamos um verão atípico, se não
escutasse ainda um resto de silencio querendo acalentar meus receios e espreitar
minhas desordens. Tentava sorrateiro, o lúgubre calado, intercalar uma
racionalização indiscreta entre minhas emoções e com isto desestabilizar uma
paranoia promissora, ainda em botão. Paranoia tem de ser cultivada com carinho
e salva de meditações lógicas. Lembro-me, como se fosse hoje, pendia
indiferente sobre uma tristeza, não sei se minha ou dela, beijando as bordas da
solidão, uma andorinha introspectiva a espera de o destino enxotá-la para suas
obrigações e desejos. Nossas relações, andorinha introvertida e eu, não poderiam
sequer retornar, se estes gestos e acontecimentos gratos e fortuitos não
ficassem indefinidos como os meandros dos sonhos e devaneios carecem ser. Desvaineicendo
foi naquele momento o perfeito cio das profecias ajustadas à fecundação do
alçar em destino incerto da andorinha com minha solidão amamentada em
expectativa grená bordando o sofrimento. Os advérbios, neste silogismo, não
poderiam fugir da lógica clássica e para tanto esta cerimônia deveria seguir
rigorosamente o ritual de metáforas em gestação ou regrediriam ao inconsciente.
Por definição, fomos tempestivamente assaltados pela angústia, as fantasias confabulavam
incomodadas sem virem à luz, assim se deram os fatos: tanto que a andorinha
insinuava sobre o desconhecido antes de alçar ao além, o vento interpolou seu
gemido candente aos dobrados dos sinos da capela pobre, não consegui eu
despir-me dos preconceitos, pois o tempo, em consideração ao desespero, metamorfoseou-se
para enfeitar o poente.
Não havia razão para nos masturbarmos
ou tentarmos entendimentos pessoais face à heterogeneidade dos valores e
preconceitos esparramados entre o futuro incerto e uma penca de meditações
pretendendo amadurecer para o outono. A andorinha, proposital e disfarçadamente, se desfez
de escutar meus imaginários sussurrados sobre seu pio doce, para não interferir
na rima e métrica da poesia que deveria ser parida e afagada pela fantasia e,
em contrapartida, abortar a paranoia. Mais do que uma hipótese era uma
reconciliação com a demência abrindo espaços para o desconhecido. O sino,
indiferente, sem falas outras que não suportava mais, sobreveio com sua
nostalgia enquanto se deu ao verde escutar tão longe quanto a saudade alcançava.
Realmente parecia verão, embora as borboletas voassem indeterminadas e em na
ordem das cores invertidas, mas respeitosas. Dispus-me a quedar sem mais orgulho
ou afobação para não melindrar o destino. Escutei, antes de tomar outra
decisão, um ruído inconfundível, metafísico, sobre minha hipótese mais robusta,
a melancolia. Com isto conferi as pedras das sortes, que lançadas ao dará espelhariam
o porvir. Confirmou-se, poderia ser mesmo verão, pelas reflexos estereotipadas
dos gestos da ansiedade. Assim, imaginei profundo, o mais alto possível e tão delicado
quanto, sugerindo à andorinha escolher voar para o infinito ou deixar um pedaço
afável das nossas relações sobre a tristeza em que ela pousara. Em seu lugar,
como símbolo da solidão, a saudade ficaria ocupando seu retorno dos aléns
vazios, pedindo desesperadamente para Deus despetalar notícias dela.
Isto poderia parecer questão de
somenos, mas naquela circunstância, para conciliar as intenções e os objetivos
da ave indiferente às minhas propostas claras, teria uma única solução factível:
incrementaria o imaginário inibido, pediria clemência aos sinos distantes para
enfeitiçarem para sempre a altivez de a andorinha pintar o cair da tarde com
insinuações disfarçadas de arco-íris e esperança. No solfejo tentaria enganar
minha opressão, pois esta, caminhando sorrateira entre os meus mais íntimos devaneios,
esperava tocaiar-me na curva do desconhecido. Insatisfeita e avessa, a opressão
despachou para o infinito do nunca mais a ave delicada, que peregrinou antes de
receber indiferente as minhas fantasias afetivas. Não haveria mais tempo para
apaziguar-me sem recorrer à demência suave. Com certeza me traria sossego e
solidão. O outono chegaria a poucos dias, tanto que se confirmou que uma
andorinha só não faria verão e tive de me restar chorando melancólico.
Carlos, bela e melancolica cronica. Mas espero que vc não desista da andorinha.
ResponderExcluirSr Florence... è fato que uma andorinha não faz verão... mas é preciso a chegada da PRIMEIRA. Belíssima crônica. Estava sentindo falta.
ResponderExcluirque bom que voltou a publicá-las.
Sra. Márcia
Excluircomo sempre extremamente atenciosa e carinhosa com os seus comentários. É uma alegria saber que sempre existe uma andorinha sobrevoando as fantasias que, como escritor, lanço ao dará. Muito Obrigado.
Encantadora! As ondas sonoras que atraem os pássaros, vibram como mistérios para atrai-las. "As andorinhas voltaram..." Assim assegura o compositor.
ResponderExcluirMuito obrigado pela visita, carinho e atenção. Este é o motivo permanente porque as andorinhas sempre voltam.
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