SERTÕES E OUTRAS
DESFORRAS DAS SECAS
Achegaram
gemidos, mesmo no carreiro vindo, como codorninha no verão enfeitiçada de
agouros da cascavel desabusada na captura, ano prometido de sinistros. E as
sinas se inverteram, concordadas nas previsões dos sinistros se darem nos
tempos marcados. Pôs-se da chuva começar a escassear nos roçados, desajustando
por conta desesperança de fartura, que já era miúda e barganhou o restinho por
minguados, ademais fome piscando vinha caolha olhando braba por trás dos
cerrados. Da soleira da porta do sítio, Camiló Prouco, persignou-se voltado de
frente para os cantos das juritis pousadas viçadas no graúdo do bacupari
petulante, virou contra o vento para desmolhar, antes de, na sequência, sério e
compenetrado, urinar aguado, mole, largo, com fé e candura, sobre os
encarvoados rabiscados por Inhazinha, tisnados no chão na véspera, sua mulher
de desforras, coitos e assanhados melindres acudidos na cama, mesa e fogão. Não
se punha como desrespeitoso ou desventurado, como sabido, mas premido atendente
de servidão e mandado obediente das ordens certas das crenças reverenciadas,
amoldadas a prosperarem robustas, como se era sempre.
O
calor gemia desforra, passarada provocada para refrescar nos revoados agitados
e proveito dos ventos certos. O tempo se dava por ser e vinham proseados de
desperdícios e falta de sustentos nas chuvas, abobados de serventia e reza, mas
chapiscados de texturas e sabor, se o sol acordava o burburinho da bicharada ou
a algazarra das revoadas obrigavam a claridade bocejar pelos esparramados dotes
de belezura da Serra da Forquilha e destravar as atarefadas. Camiló Prouco, até
as coisas tomarem outros rumos, enquanto desaquecia a ressaca da bebida forte
da noite anterior, choramingava sinceridade disfarçada na beira da bica do
córrego, aonde Inhazinha, a mulher, continuava a batida da roupa na tábua larga
de peroba aproveitando restado se dando da aguada diminuindo, encolhendo de se
ver sumir cada dia um tanto. Acordava lerdo de raciocínio mal lembrado, o
trançador, jogador de truco, da hora de deixado as tramas, noite alta, as
pingas, as mandingas e ajustara o jacá das tiras de couros aos costados para
arribar serra acima já lua galopando. O curiango, olhos sisudos de curioso, pio
mole, acompanhava as sinas das vinganças, dos malfadados, dos desdouros, dos
sofrimentos achegados aos dedos e aos destinos que Camiló solveu pesado durante
um dia todos de trabalhos a fazer. E os espíritos compadecidos e as almas
sanadas dos assistidos por Camiló nas explicações das contas pendentes satisfeitas
à mulher e entendiam-se nos direitos de agadanharem seus prosados para
continuarem sentido seus dedos macios, suas falas cantadas, suas preces
sentidas. Inhazinha ouvia o silêncio, ajuizava rancores, considerava mentiras
repetidas de um sertão inteiro de solidão a dois, sentia o cheiro da tramoia
encarapitada sobre o provável, que só falhava e deixava o marrequinho afundar
na taboa a catadura de alguma ilusão passada no brilho do lambari desinibido,
do mosquito zunidor, da varejeira azul, embernada de más intenções.
As
águas foram aprendendo a refugar amarradas nos tempos e preparando os cerrados
para receberem as secas desacomodando almas e esperanças.
Ceflorence 13/09/17 email
cflorence.amabrasil@uol.com.br
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