quinta-feira, 21 de setembro de 2017

SERTÕES E OUTRAS DESFORRAS DAS SECAS
Achegaram gemidos, mesmo no carreiro vindo, como codorninha no verão enfeitiçada de agouros da cascavel desabusada na captura, ano prometido de sinistros. E as sinas se inverteram, concordadas nas previsões dos sinistros se darem nos tempos marcados. Pôs-se da chuva começar a escassear nos roçados, desajustando por conta desesperança de fartura, que já era miúda e barganhou o restinho por minguados, ademais fome piscando vinha caolha olhando braba por trás dos cerrados. Da soleira da porta do sítio, Camiló Prouco, persignou-se voltado de frente para os cantos das juritis pousadas viçadas no graúdo do bacupari petulante, virou contra o vento para desmolhar, antes de, na sequência, sério e compenetrado, urinar aguado, mole, largo, com fé e candura, sobre os encarvoados rabiscados por Inhazinha, tisnados no chão na véspera, sua mulher de desforras, coitos e assanhados melindres acudidos na cama, mesa e fogão. Não se punha como desrespeitoso ou desventurado, como sabido, mas premido atendente de servidão e mandado obediente das ordens certas das crenças reverenciadas, amoldadas a prosperarem robustas, como se era sempre.
O calor gemia desforra, passarada provocada para refrescar nos revoados agitados e proveito dos ventos certos. O tempo se dava por ser e vinham proseados de desperdícios e falta de sustentos nas chuvas, abobados de serventia e reza, mas chapiscados de texturas e sabor, se o sol acordava o burburinho da bicharada ou a algazarra das revoadas obrigavam a claridade bocejar pelos esparramados dotes de belezura da Serra da Forquilha e destravar as atarefadas. Camiló Prouco, até as coisas tomarem outros rumos, enquanto desaquecia a ressaca da bebida forte da noite anterior, choramingava sinceridade disfarçada na beira da bica do córrego, aonde Inhazinha, a mulher, continuava a batida da roupa na tábua larga de peroba aproveitando restado se dando da aguada diminuindo, encolhendo de se ver sumir cada dia um tanto. Acordava lerdo de raciocínio mal lembrado, o trançador, jogador de truco, da hora de deixado as tramas, noite alta, as pingas, as mandingas e ajustara o jacá das tiras de couros aos costados para arribar serra acima já lua galopando. O curiango, olhos sisudos de curioso, pio mole, acompanhava as sinas das vinganças, dos malfadados, dos desdouros, dos sofrimentos achegados aos dedos e aos destinos que Camiló solveu pesado durante um dia todos de trabalhos a fazer. E os espíritos compadecidos e as almas sanadas dos assistidos por Camiló nas explicações das contas pendentes satisfeitas à mulher e entendiam-se nos direitos de agadanharem seus prosados para continuarem sentido seus dedos macios, suas falas cantadas, suas preces sentidas. Inhazinha ouvia o silêncio, ajuizava rancores, considerava mentiras repetidas de um sertão inteiro de solidão a dois, sentia o cheiro da tramoia encarapitada sobre o provável, que só falhava e deixava o marrequinho afundar na taboa a catadura de alguma ilusão passada no brilho do lambari desinibido, do mosquito zunidor, da varejeira azul, embernada de más intenções.
As águas foram aprendendo a refugar amarradas nos tempos e preparando os cerrados para receberem as secas desacomodando almas e esperanças.
Ceflorence    13/09/17     email   cflorence.amabrasil@uol.com.br   

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