PUBLICADA NOS JORNAIS “JC REGIONAL” E
“O PINHALENSE” – 09/01/16
AFINIDADES DO ENCANTO
Quando o inverno
alquebrado acomoda-se pleno em Nibunsty, depois de viajar cansado um equinócio
inteiro para esconder-se do equador, as Vílkias carregam seus argumentos, suas
fantasias e seus desejos para o colo aconchegante das chaminés de barro,
praticam o silêncio gregário e se enlevam com as delícias da preguiça. Estas
preguiças só se arrematarão em prazer no fim da estação, com a chegada
carinhosa dos Léscios. Neste período em que o azul se esconde entre os
traquejos moles das esperanças imberbes, o silêncio aproveita o ensejo da
solidão para se disfarçar de paz, sugerindo meditação. As Vílkias petiscam,
descuidadas, remorsos estilhaçados a esmo pelo infinito, consultam o
imponderável escondido no inconsciente e, espionadas pela Constelação de Orion,
se masturbam calmas, pedindo-lhe que prognostique os anseios e os deleites com
que devem se entranhar para excitarem os Léscios. Neste revoando das duvidas
astrais, o arco íris se acomoda, exala expectativa e cria as condições para os
sonhos brotarem delicados e sem censuras. O amor reclama delicadezas assim para
sobreviver, como repetem os nibunstynos.
O sorriso cresce, a
sensualidade amadurece como gotículas de chuvas que, alegres, engravidadas pelo
aconchego do nada, despencam das janelas e, espedaçadas, brincam de teimosia
para encharcarem o imaginário. As Vilkias, nesta temporada, se permitem
pendurar as poucas preocupações restantes e inúteis na indiferença. O horizonte
cruza o indefinido, mastiga o absurdo, cospe a hipocrisia, se refestela
entretendo a probabilidade enquanto esta não se metamorfoseia em júbilo. Dizem
os deuses que não há melhor condimento para as fermentações das ilusões com que
as Vilkias alimentam fantasias aguardando os Léscios.
O verbo, embalado em
brisa, se acomoda dedilhando harmonias ao atravessar os caibros perfurados dos
bambus dos telhados singelos de Nibunsty. Todo este ritual milenar ocorre
prevendo que os rebentos nascidos das uniões das Vílkias e Léscios não
carecerão dialogar com as censuras para se libertarem dos traumas das
encarnações passadas. Os Ogós Ilus, tocadores de atabaques das cerimônias
Ibejis, repicam estes ritmos eternos nos couros cansados dos seus tambores
afinados em afetos sustenidos. No entremeio, as Vílkias se acomodam, esperando
o futuro e enquanto tanto, se dedicam a brincar de memória. Os mesmos velhos
caibros se encantam como flautins para participarem do festim.
Em respeito ao
adorável ócio, o melhor roteiro para o amor, crescem musgos acobertando os
desejos esgarçados que se preparam, eróticos, para devorar as censuras inúteis
antes de se perenizarem em carícias. Neste rufar das emoções, as Vílkias
anseiam pelos Léscios desbragadamente. No entanto, na dança inteligente oculta
da conquista, se insinuam sutis entre extravagâncias trançadas de anseios e
simulações fingidas de indiferença. Como esperado, não poderiam os Léscios
deixar de amamentarem-se das delícias da loucura, de escutarem a atração
invadindo o infinito e esbanjando luxúria. Sem tomarem folego, não há mais como
resistir à magia e assim lançam-se os Léscios delicados às parceiras. O jogo se
assanha, as Vilkias espargem sem recatos as suas emoções e ganas, as cores dos
casais se unificam, transcendem, implodem. O infinito se embriaga para acabar
em orgasmo. O amor venceu o tempo e o tempo venceu o nada.
Todo inverno o cenário
alegre se renova em Nibunsty. O deleite da estação de procria se alimenta das
extravagâncias avivadas. Aos Léscios é permitido, pelas divindades, se
cativarem com os bemóis suaves que as Vílkias satisfeitas exalam. Estas se
acarinham nos sustenidos dos Léscios agraciados. O inverno começa a murchar, sem
dor, do lado por onde o poente o devora. As Vílkias amolecem seus
desejos, desvestem as caricias, respiram o azul antes de chamarem a ponta da
esperança que a primavera carrega no colo. No colo da primavera, carregada de
esperança, os rebentos se contorcem lindos esperando o afeto das Vílkias e dos
Léscios, que não terão outra obrigação salvo ensiná-los a desejar procriar
enlevados sempre nos invernos de Nibunsty.
Dos deuses e dos
demônios carecem explicações do porque derramaram, atabalhoados, mulheres e
homens irados sobre a terra e agraciaram Nibunsty com a graça e sabedoria das
Vílkias e dos Léscios?
Ceflorence
20/12/15 email cflorence.amabrasil@uol.com.br
Li e releio as crônicas... A cada leitura descubro sutilezas que antes não havia percebido.
ResponderExcluirSra. Marcia É uma alegria encontrar os gratificantes comentários da senhora no Blog. Muito obrigado. Florence
ResponderExcluir