ADENDOS A OUTRAS MINÚCIAS IMPERTINENTES DO EXISTIR EM COGITO
Certo sonido
sexual impúbere, imagino azul ou da linha de Ogum, ousava, insisto, ainda em
sustenido, atravessou contra a mão o subjetivo que vestia eu em compasso de sublimação
e se dispôs, petulante, com sua irreverência, a irromper altivo pelos meus
meandros afetivos. Surpreendeu-me desprevenido na sua forma contumaz, algoz, já
plasmando confortavelmente em meu ego. Nunca sei se insinuava-se invadir pela
alma pré-disposta ou pelo cerebelo, talvez através da consciência, supunha,
aliás, pelo espírito, quiçá distorcendo o inconsciente, talvez, quem saberia, via
mente ou materializar-se-ia em dia de gala e alcançaria pelos meandros dos apegos,
sub-repticiamente, entranhando pelo olfato, olhar, amor, pela ânsia, usurpando algo
como o além ou sorrateiramente pela porta dos fundos. Eu era, um éramos,
completamente perdido.
Sei que transcendo sem recatos em
tais momentos, mas explicito melhor, com muita calma, pois antecipo que, por
neófito em rituais exotéricos ser, também não tenho a menor hipótese dos motos
pelos quais tais se repetem. Ocorre, amiúde, em sendo sempre o primeiro
introito às minhas divagações alienadas, às vezes festivas, persecutórias
inclusas, este ribombar de ruído sexual que antecipa os porvires outros.
Neste confronto diário dos bêbados
convencionais, que milito, sou, praticamente, o único melhor dotado em tal estágio
avançado de insânia perspicaz, embora estejam outros se aprimorando com cores
indefinidas ainda, mas promissoras. Por oportuno, registro, vejo de um ponto
neutro entre o mar e minha meta uma gaivota revoar sinuosa para estimular a própria
incongruência do eu que acho ser existir. Ao se permitir bailar sobre o azul e
as ondas, deixa o rastro do invisível sobre o inexplicável antes de esconder-se
na minha memória. Sou eu que me faço ser esta presença de deixar a gaivota
existir porque a deslumbro em seu esplendor e me apodero do mundo ou a gaivota
destrói minhas megalomanias debochando do meu subjetivo?
Especularia o que Picasso afloraria deste
transe cubista? Recolhi o som ameno do voo da gaivota para explorar
corretamente em uma inutilidade ocasional posterior que o infinito pede amiúde.
Assim sinto que sofro, logo existo, plagiando a metáfora. Quando confesso que
desespero no acompanhar esta forma labiríntica do endoidecer sobre o próprio pensar,
meu padrinho, Ogolunmalé Aru, prioriza-me um passe por Iemanjá e se encarna em seguida
no seu Pai Cainhoatã, esvoaça primoroso pelos hipnóticos castigos dos atabaques
e ganzás sagrados e me abandona ao léu. Eu me reconforto até o próximo desespero.
Aché.
Enquanto o recebia, ruído contumaz,
com outras sintonias pessoais, que me enlevavam alegres ou conflituosas à irrealidade
deleitosa, pedi um copo de vinho, meia porta aberta ao subjetivo para dissimular
a claustrofobia, mais uma fatia significativa de tempo com preguiça, suficientes
e aos pontos de maturações para alimentarem o nada. Tudo, creio, oportuno,
considerando as variantes mutáveis expressas e adequadas ao contexto de desvario
que eu perseguia. O dia se fazia seguir acompanhando as malemolências e as constâncias
das marés para obedecerem aos ditames das luas e dos videntes. Continuei sem
saber o que era maré ou o que não era eu para apreciar saborear o porvir. Atino
calado, mas não escuto o silêncio perguntar se sou eu que semeio estes delírios
para rebrotarem no meu absurdo ou o todo se veste de seu nada preferido, tão
simples, para só deixar a brisa mansa se dar a lavar as águas das areias
brancas e me ensinar o belo? A gaivota retornou melindrosa para revoar delicada
sobre seu sumiço e me liberou a memória para outras demências. São estas poucas
superposições que me encantam e jamais se explicam porque depois aflora a
psicose.
Com estes antanhos demarcados, os
demais aderentes, sonhos, fantasias, emoções, gaivotas, tristezas, dúvidas, marés
seguiram aconchegando ao meu átrio, bebida farta, euforias e espontaneidades
incontroláveis, como meus delírios preferem ao conclamar a entropia psicótica
do irreconciliável. Confabulam entre si com metáforas sutis, difusas,
persecutórias, bipolaridades que eu desfio para mim como se desejasse encontrar
o amém ou o infinito.
É inacreditável, as insânias se interdependem,
ajustam, confabulam, interpolam, sonegam, mas não explicam ao meu desespero. Abdico,
cedo então ao evento e componho vivas aos convivas achegados pelos meandros dos
imponderáveis, incontrolados que se assentam nas controvérsias da tábula rasa que
vai sendo ocupada. Em transe existencial eterno sou eu jamais não sendo, nunca provenho,
pois represento ao infinito os comandos dos conflitos que me subordinam. Sofro
ou me preparo para o orgasmo?
Mesa suficientemente extensa para
acomodar a tristeza na cabeceira oposta, ficando o ciúme, modesto, na lateral a
direita, depois do perdão, mas antes da ironia. A perene aflição sexual
acomodou-se, ansiosa, entremeio a atração e a censura impondo certa dicotomia
existencial à angústia a ponto de esta exigir seu espaço ao lado da solidão e
pretendendo envolver no abraço a depressão que ocupava lugar de honra no
cenário. Éramos um eu indiscutível e soberbo no palco do teatro em absurdo
representando as multiplicações dos eus infinitos que eu éramos sem ser. Até
então tentei chorar um sorriso, mas a indecisão solicitou mais uma rodada de
vinho.
Os algoritmos se colocaram em um
bailado delicado deixando o azul fluir para a depressão já se estendendo mais acinzentada
antes de enveredar pelas paredes escorregadias e sujas do meu cérebro. Silêncio,
tanto que os devaneios e olhares fugiram pelas janelas para buscarem, nos
desconhecidos das censuras inconscientes, as imaginações para serem servidas às
fantasias lépidas entre os meandros irrequietos das ideias. As ondas foram
comparsas nestas alegorias e deixei o horizonte cavalgar minhas fantasias. Sou
o executor das tarefas e mensagens dos desejos, anseios e traumas sem ter sequer
o prover das decisões, submisso sofro. Comandam-me, não comando jamais. Escuto
a solidão da maré montante invejar a gaivota oscilar sobre o marulho das
espumas nas pedras caladas para brincarem de dúvidas. Real ou existe algo além
da demência a me acalantar? O vinho não
é de todo mal.
Meus sonhos se transformaram em
visões para estas se permitirem de mãos dadas com o medo, a vontade, saudade, a
ânsia, sigilo, a premonição, masoquismo cirandarem eufóricos ora com a
angústia, depois com a euforia, por fim com o arrependimento. Pasmo, a benção
de meu padrinho caiu sobre a angústia e sem recatos procurou a nostalgia mais
próxima para se bolinarem. Eram independentes e espontâneas as emoções, mas não
me permitiam fruir suas intenções e procedimentos. Executava as determinações,
exercia, competente, como me restava, para não entrar em metamorfose esquizofrênica.
A porta da capela bateu, com o vento, por não escutar mais os meus anseios.
Acompanhava estes momentos irreconciliáveis
de distúrbios desacomodados e jubilosos do meu interior mental, enquanto discutia
os motivos descabidos com a paranoia mais afetiva sobre a frustração do último amor.
Conversávamos entrelaçados, debruçados sobre a toalha de utopia disposta pelo
meu delírio se fazendo estender do imponderável até às mudanças furta-cores que
se permitiam entardecer encantando as metamorfoses e os grenás poentes. Fixo o
copo translúcido para enxergar o aroma indefinido da nostalgia. Corriam estes
coloridos em danças e metáforas dodecafônicas, esbeltas, efêmeras como o amor que
se imagina eterno, brincando de rouba-montinho com a decepção e os meus
tropeços de auto análise.
Assim, abertamente, ao me emocionar
alcoolizado, acredito-me já com toda fé que este meu raciocínio intempestivo,
brilhante, babélico, é, além de correto, inútil, perfeito, incompleto, mas insinuante
para o meu ego estéril, brilhante, egocêntrico. Percorro os patamares Junguianos
na busca de captar nos lençóis freáticos das minhas fobias e preconceitos,
camadas que ainda não haviam sido perfuradas para reformular estes paradoxos. Em
vão, a gaivota envolvida em uma película de nada arrasta meu olhar pensante para
uma ilha deserta em que gostaria de ser enterrado ou parido novamente. Soberbo,
estacionou o ruído na adjacência frontal do meu inconsciente despreparado e
imaturo, sem respeito as regras existenciais e, portanto, antes mesmo de
embriagar-me ou encarnar algo apropriado à incongruência. Preparo-me para ouvir
a implosão do nada que sempre me acalanta. Poderia ter-me recolhido em recato,
mas um talvez se interpôs entre o pretérito e o desejo. Apavoro-me, pelo amor de
.... oh! Deus.
Do oposto, em uma latitude azul
transversal, não mais do que dois sorrisos antes de uma memória ainda
engatinhando, um colibri delicado, sensibilizou-se com minha tristeza em dúvida
e sugou com primor meus delírios para escondê-los entre umas pétalas de
fantasias. Sentei-me, após mudar, no outro canto, o esquerdo, da mesa, ao lado da
solidão, pedindo outro copo de bebida. Aguardei meu paradoxo confabular com o
desejo o que determinariam fazermos. O mar chamou ao sol para se recolherem e
eu permiti. A gaivota não comentou o princípio da lei da aptidão ou do mais
forte para a sobrevivência da espécie. Coisas do materialismo histórico que
detesto.
Não poderia saber de mim. Sendo tal não
percebi se haveria alguma simbologia envolvendo-me neste enigma da gaivota
brincando de maré ao pôr do sol embora a concretude do delírio mantivesse suaves
contornos cubistas. Premuni que jamais entenderia meus anseios enquanto não definisse
se a gaivota estranha exibiria às minhas alienações antes de revoar para seus
infinitos distantes levando meus distúrbios. Ocorreu-me se existiria ela
realmente só para incrementar minhas controvérsias flutuando com as marés? O
vinho não respondeu. Senti agradável este enlevo que não levava a nada, mas não
contradizia a brisa suave a montante.
As sanhas macias das alucinações foram se
ajustando pelos meandros e acalantos do pensar com tendência até a algum
repouso. Pude sentir o delicioso sabor acre de que estava vivo sem saber para
que? Veio novo copo de vinho. Mandei fechar a porta claustrofóbica para sentir
como seria vestir o caixão que me destinaria ao nada.
Apreciei, afetuoso, o ruido sexual deixando
o silêncio ensinar-me a morrer como se fosse quase para sempre. Adorei o aroma
de uma memória antiga, conflitiva, mas de um amor a mais que se frustrara como
outros na eterna indecisão que carreguei pelo sempre. Ao experimentar morrer me
recebeu à porta dos devaneios uma tranquilidade que nunca existiu e me ensinou
a chorar.
Ceflorence São
Paulo - 02/03/21 e-mail carlos.florence@amabrasil.agr.br
Parabéns pela linda crônica, pelo vocabulário interessante e muito próprio.
ResponderExcluirObrigado pelo privilégio de receber suas obras.
Abraço
Mario
ExcluirMuito obrigado pela gentiliza da visita e do carinho do comentário
Florence, como sempre nos fazendo viajar pelas planícies, pelas alturas, nos fazendo refletir do porquê que estamos aqui , afinal.
ResponderExcluirParabéns!
Nelson
ExcluirÉ sempre uma enorme satisfação tê-lo aqui e receber seus comentários.
Grande abraço
Florence, como sempre nos fazendo viajar pelas planícies, pelas alturas, nos fazendo refletir do porquê que estamos aqui , afinal.
ResponderExcluirParabéns!