SONHOS
DOS INFINITOS
Melzia das Ilusões, deusa dos
prazeres e das ternuras, mal repousara dos andejos de sua labuta, atravessou um
pedaço pequeno, mas mais do que suficiente para os objetivos a que se propunha,
de fantasia ainda em botão, como fazia todas as noites antes de se prestar a
sair para confabular com as entrelinhas das venezianas fagueiras que escondiam
e acomodavam os desejos para o repouso. Meiga, Melzia, debruçou-se sobre os
olhos fechados de Nímia e ofereceu-lhe, para não assustá-la, com muito carinho,
dois sonhos azuis, uma delicada pétala de ilusões e uma clave de sol virgem.
Esta última, clave de sol virgem, ainda prestes a ser deflorada com candura
sobre as partituras em branco, como pedem as solidões a serem oferecidas nos
sonhos, aguardando, ansiosa, as mínimas, as breves, as colcheias, as semicolcheias
e, entre estas atrevidas sonoras, as indispensáveis pausas para que o universo
se tornasse justificável. Coisas dos deuses das fantasias, que não explicam
suas razões, mas com alegria deduziu Nímia que a compreensão morrera duas
estrofes atrás e fora sepultada com cantos de solidão, não atrapalhando seus
sonhos. Vagueava tão livre, sorridente, Nímia, que nem pensou em acrescer um
pedaço de portanto, inútil e pretencioso no contexto. Coisas dos mortais.
Neste ritmo, o descompasso proposital
dos sons, das figuras, das fantasias, aguardou o silêncio autorizar os
contrapontos adequados para Nímia invadir o inconsciente e deleitar-se, livre
de censuras, nos absurdos furta-cores refestelados. Bacanal dos irreais, das
deformações, das alucinações e dos subjetivos, autorizou a idolatria do delírio
sadio. Melzia das Ilusões trouxera Nímia ao ponto de desencontro para
antever-se com o além como propusera. Os amorfos inexplicáveis e as demências
carinhosas intercambiavam-se aleatoriamente, tresloucados, vivos. Cavalgou,
Nímia, sobre as notas, os desejos, os sons e os irreais. Plainou despautério
azul, sabendo, feliz, sem saber que não queria saber, por onde tresandava risonha
como feto protegido antes do estupro do parto para a guerra da vida. Encontrou-se
Nímia consigo naquele ponto inexplicável aonde o calor da irracionalidade
liberava ouvir o infinito marcado nas rimas grafadas sobre as pétalas dos
devaneios colocadas em seu caminho por Mélzia das Ilusões, deusa dos prazeres e
das ternuras. Poderia parecer excesso, mas a rotina e o cerimonial eram
rigorosos sobre os andamentos. Divagar não é fácil.
Carregava ainda, Melzia, nos seus
restados de afazeres, arrastando dentro da sua eterna e inseparável sacola de
imponderáveis, os demais utilitários que teria de distribuir entre os que
começavam a dormir, antes que as estrelas se escondessem nos sorvedouros das
montanhas que devoram a escuridão. Era assim que começava, Melzia das Ilusões,
sua faina noturna, pois só dispunha até a madrugada, quando invariavelmente furtava-se
do sol, que se a encontrasse tresandando altiva a destruiria antes de cumprir
seu destino de alimentar a esperança e a sensualidade, que só a loucura sadia cria.
Ceflorence !2/06/16 email
cflorence.amabrasil@uolcom.br
Gostei dos sonhos infinitos e especialmente da simpática deusa Melzia. Atraente essa deusa!
ResponderExcluirGostei dos sonhos infinitos e especialmente da simpática deusa Melzia. Atraente essa deusa!
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